Eclipsium — Horror de sonho febril, belo e implacável
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Acordei num lugar que respira. É estranho dizer isso de pedra e carne, mas o mundo de Eclipsium parece vivo — contrai, range, sussurra. Caminhar ali virou um pacto: cada corredor promete saída e prepara armadilha; cada clarão de “luz pálida” sugere alívio e cobra na curva. No começo, tentei correr. Foi inútil. O jogo afina o passo da gente à força — aprender a olhar antes de andar, a ouvir antes de virar, a testar o chão com o olhar como quem apalpa um sonho. Quando cede, ele entra.
O progresso não se mede por “itens”, e sim por coragem domesticada. A melhor parte é quando a trilha baixa e sobra só o som de seus pés e do cenário que respira. A arquitetura muda sob você — túmulos magros, catedrais de carne, um céu sem sol que morde o horizonte — e o caminho tem lógica, só que torta. Te empurra por espirais, te puxa por buracos onde deveria haver parede, te oferece plataformas que parecem seguras até que não sejam. Em vários momentos, avancei um metro e fiquei um minuto esperando: o jogo ensina que paciência é ferramenta.
Os poucos “quebra-cabeças” que aparecem funcionam mais como rituais do que como charadas: alinhar símbolos, sangrar uma alavanca que não devia existir, encarar uma estátua tempo demais até ela deixar de ser estátua. Quando falhei, não foi por não entender — foi por tentar impor pressa. Quando acertei, foi sempre porque respeitei o tempo do lugar. Há um fio emocional que atravessa tudo (essa figura de “Ela”, que persegue e orienta), e, sem perceber, comecei a agir como alguém carente de uma resposta que nunca chega inteira. É poderoso quando acerta: dá para sentir o aperto no estômago.
Visualmente, o jogo vende a própria mentira de modo convincente. O “lo-fi” é escolha, não limitação: volumes grandes e texturas brutas que favorecem legibilidade, cores doentias que definem humor de sala, recortes abruptos de geometria que parecem cuspidos do subconsciente. Em PC, travado a 60 e com pós-processamento comedido, a leitura fica cirúrgica — bloom demais rouba pista; contraste saudável entrega profundidade. Em picos de partículas, a taxa belisca, mas nada que quebre a hipnose se você fizer o dever de casa nos ajustes.
Há trechos em que o jogo despeja um “corra ou morra” que desafina com o resto — a perseguição mais literal troca tensão por ansiedade, e a graça maior de Eclipsium está no horror de contemplação, não no sprint. Também senti momentos em que o caminho visualmente promete segredos e, quando você arrisca, é só um buraco para a morte. Faz parte da gramática dele (punição por curiosidade cega), mas às vezes pode soar gratuito. Ainda assim, quando o design aposta em rotas tortas que parecem erradas e viram certas, nasce uma satisfação rara: você sai da sala se achando cúmplice do cenário.
A trilha é metade do feitiço. Começa discreta e, sem aviso, cresce como órgão de igreja afogada; em outras horas, some para deixar o mundo respirar alto. O áudio espacial entrega sustos honestos — ecos que denunciam distância de perigo, rangidos que “dão forma” a salas — e viro fã rápido de como o jogo usa silêncio para transformar sombra em ameaça. Não é “gritaria de jumpscare”; é cansaço do ouvido, que passa a escutar demais.
No fim, o que ficou foi a sensação de ter atravessado um pesadelo coerente. Coerente porque tem regras, mesmo que só faça sentido ali; pesadelo porque cobra caro quando você tenta jogar como “jogo de sempre”. O mundo muda, você muda com ele — sacrifica, aceita, apaga o traço da sala anterior. Quando os créditos caíram, não senti alívio; senti vontade de voltar para confirmar se aquele corredor existiu mesmo ou foi invenção minha. Isso, para horror, é ouro.
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Sou o Leo, geralmente jogo com o nick blade95. Sou apaixonado por jogos de FPS e amo montar PC Gamer! Aqui no Steamaníacos cuido de tudo sobre Hardware, review, preview, testes e novidades para o nosso mundo gamer!